Palavra da jornalista Chadia Kobeissi no Encontro Islâmico no Brasil

Em nome de Deus, O Clemente, O Misericordioso.

Que a paz e as bênçãos de Deus estejam com o Profeta Mohammad, sua purificada linhagem e seus companheiros.

Meu nome é Chadia Kobeissi, sou brasileira e libanesa, venho de uma família parte muçulmana e parte cristã ortodoxa. Nasci no Brasil, onde estudei por muitos anos em colégio de freiras. Mais tarde, fui para o Líbano, onde morei por quase dez anos no reduto do Hezbollah, nesse tempo ingressei na faculdade de jornalismo. Em 2006 estava na guerra entre Líbano e Israel, e durante a guerra fui como refugiada para a Síria. Quando voltei ao Líbano terminei meus estudos e trabalhei como correspondente Internacional, para a Rfi, uma rádio francesa. Também desenvolvi um portal online, chamado Gazeta de Beirute, com o intuito de trazer notícias mais reais sobre o Oriente Médio.

Estive perto do terrorismo algumas vezes, e algo que me surpreendeu muito foi uma explosão que ocorreu na frente da casa de meu pai, no subúrbio de Beirute, causada pelo Daesh (“Estado Islâmico”). Mas graças a Deus nós não fomos atingidos.

No ano seguinte voltei ao Brasil e recebi a notícia de que um grande amigo meu, muçulmano, havia sido martirizado enquanto lutava contra o Estado Islâmico na Síria. Nesse momento eu chorei, por tantas injustiças, e por sua morte silenciosa.

A mídia nunca fala sobre muçulmanos que lutam contra o “Estado Islâmico”, ao contrário, a mídia ocidental, coloca ambos, culpados e inocentes, com a mesma imagem, a imagem de um terrorista.

Por essa razão, e pelo que aprendi com o Imam Hussein (A.S.), resolvi fazer um livro que explica a diferença do Islam, e desses grupos terroristas, que agem na verdade contra o Islam, mas em seu nome. E foi através desse trabalho que pude primeiramente entender, para poder passar adiante.

Hoje, vou falar sobre o início do radicalismo e o terrorismo, especialmente dentro da comunidade islâmica.

Na verdade, o terrorismo ocorre desde o início da história da humanidade, em praticamente todas as civilizações, causado por indivíduos, grupos ou governos.

Dentro das religiões, há o terrorismo cristão, praticado por vários grupos, na Irlanda, Noruega, Estados Unidos e China. Há também o terrorismo judeu com ações por motivos políticos e religiosos, mas que geralmente não levam o nome de terrorismo. Um exemplo disso foi um judeu que entrou em uma mesquita e matou 27 pessoas, ele foi chamado de louco, e não de terrorista.

No entanto, essa palavra ficou bem conhecida, e empregada, após os atentados de 11 de setembro, nos Estados Unidos. Especialmente voltada contra a comunidade islâmica de forma generalizada. Por meio dessa palavra se justificou a bandeira preconceituosa contra os árabes e os muçulmanos no mundo inteiro. É verdade que a mídia acabou generalizando, mas também é verdade que existe essa célula terrorista em nossa comunidade. Mas como esse radicalismo e terrorismo, se infiltraram em nosso meio? Como isso ocorreu? Primeiro devemos entender que para haver o terrorismo precisamos de recursos, pessoas, ideias e motivos. Um exemplo que posso citar é o do Talibã no Afeganistão, grupo criado e apoiado pelos americanos na guerra contra a União Soviética.

Há vários fatores que causam o terrorismo:

1) Suporte de países com interesses como Arábia Saudita, Israel e Estados Unidos.

Várias fontes, com provas concretas, mostraram o apoio desses países a grupos terroristas. Em forma de fornecimento de armamentos, dinheiro, recrutamento e cuidados médicos. Tudo isso por interesses que giram em torno da política, geografia, economia, entre outros.

Atualmente, o “Estado Islâmico” é o grupo terrorista mais rico do mundo. Eles possuem petróleo na cidade de Mossul por exemplo. E vendem esse petróleo por um preço muito baixo, e para diversos países.

Além disso existem países que querem difamar o Islam, pois além de ser a religião que mais cresce é também aquela que é contra bebidas, drogas, jogos, juros, enfim, uma religião que faz a pessoa acordar para questões políticas e a livra da manipulação mental e de ilusões como Holywood e os sonhos americanos.

É natural que certos países desejam imperar, não apenas de forma financeira, mas principalmente com sua filosofia e cultura, que é praticamente imposta para nós. Então, por várias razões apoiam o terrorismo de forma direta ou indireta.

2) Um outro fator que leva ao terrorismo são as ideias fundamentalistas do wahabismo. O wahabismo é uma ideologia inserida dentro de uma parte bem pequena da comunidade islâmica, que ensina lições extremistas que não condizem com o Islam e com o Alcorão Sagrado.

Por exemplo, nessas escolas extremistas, eles ensinam de forma literal, sem avaliar o contexto histórico. Onde há versículos sobre guerra ou luta são menções a uma situação da época da revelação alcorânica, e não algo a ser aplicado em todos os momentos.

Na Bíblia também há versículos que se forem analisados sem contexto histórico poderiam provocar o caos.

Então, a distorção da religião é sem dúvida um fator que contribui para o terrorismo. E isso não é apenas dentro do Islam. Mas um risco que pode estar em qualquer seita ou religião.

Um caso bem famoso foi o do pastor Jim Jones, que comandou um suicídio coletivo com mais de 900 pessoas, incluindo crianças.

Vários homens pecadores foram e são considerados santos, e se tornam como divindades aos olhos dos seguidores.

Então, reforço a importância de que os líderes religiosos devem possuir uma saúde mental plena, assim como não devem ser influenciados por políticos.

3) Um outro fator importante que também gera o terrorismo é a hostilidade da mídia internacional e a islamofobia. A forma como a mídia ocidental noticia o mundo islâmico, de modo generalizado e distorcido. Isso também pode causar muitos conflitos e até provocar a ira dos mais radicais. Então é extremamente importante que os mestres da mídia tenham responsabilidade ao falar de uma comunidade, e principalmente, aprendam sobre esse assunto profundo, para não confundir toda uma população.

4) Não podemos esquecer também de um outro fator: o dinheiro. Há muitas pessoas de classes menos favorecidas dentro desses grupos terroristas, que recebem dinheiro, benefícios, abrigo e diversos recursos para participar dos mesmos.

5) Guerra, conflitos e perda de entes queridos são outros componentes para que exista atitudes terroristas. Geralmente essas pessoas que fazem parte desses grupos viveram dentro de conflitos e guerras. Muitas perderam pessoas que amavam, e que foram mortas, por países do ocidente.

6) Assim também como invasões injustificáveis, como o caso do Iraque, em 2003, quando os Estados Unidos declararam que havia no país armas de destruição em massa. Através dessa invasão milhares de pessoas foram mortas, e inclusive, um número aceito pela ONU é de seis mil crianças.

7) A causa Palestina. Um grande problema que começou em 1948, e até hoje não foi resolvido. Israel ainda ocupa e se expande dentro dessa região, matando cidadãos palestinos dentro de suas próprias casas, cometendo atrocidades e muitas vezes contrariando as Nações Unidas, mas ainda assim há um silêncio mundial.

8) A tirania e corrupção dos governantes árabes. E com a dificuldade financeira e as maldades cometidas pelos próprios líderes e políticos árabes, a população acaba tendo um baixo índice de educação. Com pouca cultura e oportunidades as chances de adentrarem um caminho errado é muito maior.

Há muitos outros fatores que causam o terrorismo, assim como o recrutamento de estrangeiros, que também tem seus próprios motivos, mas não vou entrar em mais detalhes, e informo que estes assuntos estão em meu livro, intitulado Estado Anti-Islâmico.

Olhando para esses pontos que citei, é natural, não justificável, porém natural, que algo literalmente exploda. O terrorismo é causado, e existe, por diversos fatores e por apoio de diversas nações. Não é a ruindade de um povo, mas sim, o resultado da ruindade de muitos povos.

Apenas tenho a certeza absoluta que em toda essa história existe sim algo puro e inocente, e isto é o Islam, a religião mais linda, mais abençoada, mais pacífica e mais justa que existe, porém também, a mais denegrida, a mais distorcida e a mais perseguida. E mesmo assim, a que mais cresce em todo mundo.

Os ignorantes que julgam não conhecem o Islam.

Peço a todos professores, educadores, líderes religiosos e o pessoal da mídia, que antes de falar sobre o Islam tenham a consciência mínima de pelo menos estudar. Porque vocês são responsáveis por formar pensamentos. E podem sim, acabar com o terrorismo.

Devemos lutar contra esse radicalismo e terrorismo com o conhecimento, educação e moderação. Devemos lutar, pelo menos com nossas palavras, pois há jovens lutando contra o terrorismo, neste exato momento, com a própria vida.

Que a paz esteja com o homem da paz, Mohammad (S.A.A.S.).

Wassalem waleikom!

Chadia Kobeissi, jornalista.
Encontro Islâmico no Brasil – São Paulo, 29 de julho de 2017.

 

 

 

 

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