Ayatullah Al-Odhma Mártir Sayyed Mohammad Baquer Assadr (K.S.)

Seu pai foi o Sayyed Haydar Assadr (K.S.) nascido em Samarra, no Iraque, o qual foi um dos maiores eruditos e um grande Marje’ da época. E faleceu na cidade de Cadhemiah, no Iraque, deixando três filhos: Sayyed Isma’il, Sayyed Mohammad Baquer e Al-Alauiah Aminah (conhecida como Bent Al-Hoda). Sua mãe era filha do Ayatullah Sheikh Mohammad Hassan al-Yassin (K.S.). Sayyed Mohammad Baquer Assadr nasceu na cidade de Cadhemiah, no mês de Dhul Quida de 1351 Hejrita, o equivalente ao mês de Março de 1933. Já no início de sua infância foi privado da companhia do pai, sendo criado por seu irmão mais velho e sua honrosa mãe.

Aos 25 anos de idade Sayyed Assadr completou os estágios da Hawza. Um ano depois, começou a dar aulas no Bahth Al-Kharej na própria Hawza. Casou-se então com sua prima, filha do Ayatullah Al-Odhma Sayyed Sadr Addin Assadr (K.S.) e desse abençoado matrimônio nasceram cinco filhos: um menino e quatro meninas. Os esposos de duas de suas filhas foram martirizados juntamente com ele.

Assadr era e é conhecido por seu importante papel como um dos principais líderes e sábios Islâmicos contemporâneos. Entre as suas principais características estavam o fato de ser compreensivo; astuto na discussão de assuntos delicados; progressivo; regularidade em seus objetivos; lógica e consciência em suas decisões. E seu destaque pode ser confirmado pelos múltiplos papéis que desempenhou em prol do Islam, como: ter lecionado no Bahth Al-Kharej por mais de vinte anos; ter auxiliado intelectualmente o grupo de lideres religiosos da revista Islâmica iraquiana Al-Adhwah; ter prestado assistência às faculdades de Ensino Religioso; ter construído uma nova instituição para os Sábios Xiitas conhecida mundialmente, a Marja`yya al-Maudu’iyah; ter sido autor de considerados trabalhos nos campos da Economia, Lógica, Jurisprudência, Princípios da Crença e outros; e ter sido autor de valiosos artigos político-intelectuais em defesa da República Islâmica do Irã. Fora tantos outros papéis que mencionaremos mais adiante nesta biografia.

Entre suas principais obras estão:

1. Iqtisadona (Nossa Economia), 2 vls.;

2. Falsafatona (Nossa Filosofia), incluindo estudos de Filosofia e Existência;

3. As Bases Lógicas da Indução, incluindo uma perspectiva moderna do conhecimento filosófico, além de novas respostas ao problema filosófico da indução;

4. Estudos sobre Jurisprudências, 4 vls.;

5. Explicações sobre Orwat Al-Wuthqa, 4 vls.;

6- A Escola Islâmica.

7- O Estado Islâmico.

8- Fadak na Historia.

9- O Islam Lidera a Vida, 6 vls

10- Diversas palestras e discursos feitos perante os jovens estudantes de Najaf.

Mas para vislumbrar a grandiosa vida de Sayyed Mohammad Baquer Assadr devemos nos voltar para sua vida política e para o papel do mesmo no ativismo político Xiita do Iraque entre os anos de 1958 e 1980. E é isto que faremos nas linhas que se seguem, a fim de apresentar ao leitor esta grande personalidade e sua expressão puramente Islâmica, humanista e progressiva.

Em 8 de abril de 1980, Mohammad Baquer Assadr foi executado. Sua execução não despertou nenhuma crítica do Ocidente ao regime iraquiano, isto porque Assadr tinha apoiado abertamente o regime do Ayatullah Khomeini no Irã, e porque o Ocidente estava distraído pela turbulência que se seguiu no Irã após a revolução. Os governos da região e do ocidente estavam preocupados que a revolução islâmica do Irã fosse “exportada”, e se propuseram a eliminar esta ameaça. Quando o Ayatullah Khomeini conclamou os Muçulmanos no Iraque a seguirem o exemplo do povo iraniano e a se levantarem contra o regime corrupto, socialista e secular do partido Ba`ath, interpretou-se isso como o primeiro passo para a expansão do radicalismo Islâmico, que por fim conduziria à desestabilização da região como um todo.

O apoio de Assadr à luta de Khomeini contra o regime do Ba`ath foi considerado uma ameaça ao regime iraquiano e resolvido de forma imediata. Milhares de pessoas foram presas, e centenas foram executadas sem julgamento. Assadr, como o líder de um movimento que ganhou apoio popular a partir do sucesso da revolução iraniana, emergiu como um líder anti-governamental e como um catalisador para as atividades anti-Ba`ath, e sendo assim foi considerado por seus seguidores o “Khomeini” do Iraque. O regime Ba`ath decidiu que ele teria que ser eliminado se o regime desejasse sobreviver. A execução de Assadr, portanto, foi um ato de um regime autoritário lutando por sua sobrevivência.

O que tornava o Islam politizado uma grave ameaça para os regimes na área não era simplesmente seu apelo popular, mas também, as organizações das massas que abraçavam seus princípios e slogans. Em quase todos os países do Oriente Médio grupos políticos tinham, desde a virada do século, estado propensos a implementar seu principal objetivo de estabelecer um estado baseado nos princípios e ensinamentos do Islam, e estas mesmas organizações tinham preparado o caminho para a vitória da revolução no Irã. O Imam Khomeini (K.S.) também encontrava neles os meios e a força política para exportar as idéias revolucionárias Islâmicas para o resto do Oriente Médio.

Algumas dessas organizações, inclusive o Partido Da`wah Islâmico que Assadr fundou, tinham existido antes da revolução Islâmica iraniana e o regime Ba`ath do Iraque. Assadr era também o articulador intelectual de um programa que visava estabelecer um estado Islâmico não apenas no Iraque, mas em todo o mundo Islâmico. O papel que Assadr desempenhou na comunidade xiita do Iraque de modo geral, e seu esforço para se opor à aquiescência política da instituição religiosa, e para confrontar a opressão política, fizeram dele o líder xiita daquele país. Um detalhado registro dos eventos que levaram à ascensão e à queda de Assadr é, portanto, apropriado para colocar Assadr no contexto da política iraquiana em geral, e do movimento Islâmico em particular.

A ascensão de Assadr.

Em 1958, um golpe militar deu início a um período de grande turbulência no Iraque, que transformou seu sistema político e tecido social. A monarquia que tinha sido instalada pelas forças de ocupação britânicas em 1921 foi substituída por uma “república” sob o governo de uma junta militar, a família real e a classe governante foram executados. O líder da junta militar, General Qasim, que tinha encabeçado a revolta, ganhou um apoio popular sem precedentes na história moderna do país, em parte devido a razão de sua política desassociar o Iraque da Grã-Bretanha, política esta que incluía a retirada da aliança conhecida como o “Pacto de Bagdá” e o fechamento das bases militares britânicas no país.

Com o golpe estabelecido, uma variedade de grupos políticos buscava um lugar no novo regime, e neste processo criou-se uma situação de desordem. Dentre estes grupos, ao Partido Comunista, que era o mais organizado, foi dada voz no novo regime. Para aumentar sua base de poder no país Qasim usou os comunistas para eliminar seus companheiros de governo que eram leais aos movimentos nacionalistas árabes. No sangrento confronto urbano que se seguiu, principalmente nas cidades do norte, Mousel e Karkuk, onde os nacionalistas tentavam um golpe militar contra Qasim, os comunistas se destacaram como a maior força política.

Os estabelecimentos religiosos xiitas, aquiescentes desde sua última revolta contra os ingleses em 1920, se viram ameaçadas pelas forças políticas ateístas que, se deixadas sem controle, podiam varrer o Islam da vida do povo, pois a nação parecia estar saudando o secularismo e os sentimentos anti-religiosos do novo regime, e aceitando a propaganda comunista que acusava os estabelecimentos religiosos de reacionários e a religião de ser uma espécie de obstáculo à modernização e ao progresso do povo. As forças comunistas começaram então a se infiltrar nos próprios estabelecimentos religiosos das cidades sagradas de Najaf e Karbalá, recrutando membros das famílias religiosas, mas as lideranças religiosas sob o comando do Ayatullah Al-Odhma Asayyed Mohsen Al-Hakim (K.S.), tomaram medidas para superar estes desafios.

O estabelecimento religioso xiita, ou seja, a Hawza, se encontrava dividido entre os sábios tradicionais que advogavam indiferença ou desprezo à política e os ativistas que defendiam o envolvimento. O segundo grupo organizou-se dentro da Jama’at Al-Ulamah em Najaf para enfrentar as tendências anti-religiosas da sociedade. Sayyed Mohammad Baquer Assadr (K.S.) era naquele tempo um sábio jovem, e não era considerado um membro oficial da Jama’at Al-Ulamah (uma comissão de Sábios da época), que era formada principalmente por anciãos e eruditos famosos. Ele conseguiu, contudo, exercer influência sobre o grupo através de seu irmão mais velho, Sayyed Ismail Assadr, um sábio que ocupava uma posição importante na Jama’at.

De acordo com Talib Ar-Rifa’i, a Jama’at tinha como seu objetivo imediato enfrentar o desafio do comunismo ao Islam. Em sua estratégia, eles foram realistas o bastante para apaziguar o popular Qasim, apoiaram-no em seus manifestos e folhetos públicos, enquanto atacavam os comunistas. Como recompensa, o regime de Qasim lhes deu acesso à rádio controlada pelo governo. As declarações semanais da Jama’at ao público eram escritas por Sayyed Mohhamd Baquer Assadr e lidas por Hadi Al-Hakim. Esta tranqüilidade não durou muito. O conflito entre a liderança religiosa e Qasim irrompeu quando Ayatullah Mohsen Al-Hakim emitiu um decreto religioso que identificava o comunismo com o ateísmo, e proibiu os Muçulmanos de aderirem ao Partido Comunista ou auxiliá-lo em sua causa. O decreto causava embaraço ao governo de Qasim, e forçava o General a abandonar o Partido Comunista iraquiano. Qasim fez várias solicitações para visitar o Ayatullah Mohsen Al-Hakim, mas este se recusava a recebê-lo até que ele tivesse ab-rogado a lei das liberdades civis, que violava os códigos Islâmicos de herança.

Por dois anos, durante o período de calma, a Jama’at Al Ulama’ tinha recebido permissão para publicar um jornal mensal, chamado Al-Adhwah (As Luzes), cujo objetivo era enfrentar a intensa propaganda secular e anti-religiosa que se seguiu após a revolução de 1958. De acordo com Talib Ar-Rifa’i, Ayyatullah Mohsen Al-Hakim tinha idealizado tal jornal, mas já que não era apropriado para um Marje` patrocinar uma publicação política, solicitou à Jama’at Al Ulama’ que assumisse a tarefa. Sayyed Mohammad Baquer Assadr escrevia seus editoriais, os quais ele usava para traçar o programa político do movimento Islâmico, e no decorrer deste processo descobriu que tinha talento para escrever de modo persuasivo.

Durante o mesmo período, Sayyed Asaadr publicou seu primeiro estudo filosófico, Falsafatona (Nossa Filosofia, 1959), uma crítica ao comunismo, à escola do pensamento materialista e à dialética do materialismo, no qual Assadr argumentava que o comunismo tinha muitas falhas e carências para que fosse considerado como a verdade final para a humanidade. Ele, o comunismo, não poderia ser a resposta para os problemas da sociedade, pois suas bases hipotéticas eram falsas. Seu segundo trabalho, Iqtisadona (Nossa Economia, 1961) criticava as teorias econômicas do comunismo e do capitalismo, e apresentava uma teoria Islâmica da economia política, num esforço para desmentir o argumento dos secularistas e dos comunistas, os quais defendiam que o Islam carecia de soluções para os problemas do homem nos tempos modernos. A maior tarefa do Sayyed Assadr na obra Iqtisadona foi a de demonstrar que o Islam tinha a preocupação com o bem estar econômico do homem. De fato, sua maior realização intelectual foi a formulação de uma doutrina econômica Islâmica baseada nas leis do Islam, e ele foi o primeiro a fazer isso.

Sayyed Mohammad Baquer Assadr e outros líderes sábios fundaram o partido Da`wah Islâmico no dia 17 de Rabi al-Aual de 1377 H, o equivalente a 12 de Outubro de 1957, e se confrontaram com forças seculares por meio da fundação do partido.

Até mesmo o nome do partido, Da`wah (Chamado), diz-se que foi uma idéia de Assadr. O objetivo do partido Da`wah era organizar Muçulmanos devotados, com o fito de tomar o poder e estabelecer um estado Islâmico. Para atingir este objetivo doutrinaria revolucionários para lutarem contra o regime corrupto e estabelecerem um estado Islâmico, em seguida se avançaria para o implemento de leis Islâmicas, e se exportaria a revolução Islâmica para o resto do mundo. Este grande plano é atribuído a Assadr. A primeira etapa tinha de ser clandestina, para garantir a segurança do partido contra um endurecimento do regime, assim, o partido foi organizado numa estrutura de células hierárquicas multi-ramificadas. Suas atividades não seriam limitadas somente ao Iraque, mas também deveriam se realizar em outras comunidades xiitas ao redor do mundo. Para este fim, ramificações foram formadas secretamente nos países do Golfo e também no Líbano.

De volta a Hawza.

Em 1960, Sayyed Mohammad Baquer Assadr era um dos destacados eruditos da escola religiosa de Najaf Al-Ashraf, com uma distinta reputação em jurisprudência. Seus mestres na Hawza aconselharam-no a desistir de seu papel político no partido e no jornal, o que lhe era prejudicial à sua liderança na Hawza, e a se preparar para se tornar o futuro Grande Marje` dos xiitas, já que a Hawza não aceitaria um Mujtahid politicamente ativo para a posição de Grande Marje`, muito menos um membro de um partido político. O Marje` é comumente selecionado dentre os eruditos destacados no Fiqh e no Usul Al-Fiqh, e o candidato tem que provar sua capacidade nestas áreas pelo uso do método socrático em seu método de ensino, e pela publicação de suas opiniões legais. Desde que sua nomeação dependia da aprovação dos professores e dos eruditos da Hawza, a perspectiva de Assadr tornar-se o Grande Marje` de todos os xiitas estava em risco enquanto ele continuasse sua atividade política.

Muito embora a pressão sobre Sayyed Assadr para que desistisse de suas atividades políticas parecesse vir principalmente do Marje` Ayatullah Asayyed Mohsen Al-Hakim (K.S.), muitas facções da Hawza eram críticas a seu ativismo. Uma campanha pública liderada por Hussain Assafi foi lançada contra Assadr, descrevendo suas atividades como prejudiciais à sobrevivência da Hawza. Um grupo da Jama’at, influenciado pela campanha, começou a também demonstrar sua insatisfação para com ele. Os editoriais de Assadr pra o jornal Al-Adhwah também levantaram uma questão inquietante: eles eram sub-entitulados Resalatona (Nossa Mensagem), mas os inimigos de Assadr questionavam se seus artigos representavam os pontos de vista da Jama’at. Finalmente, em 1961, Ayatullah Mohsen Al-Hakim (K.S.), por meio de seu filho Mahdi, persuadiu Assadr a abandonar seus postos de jurisconsulto do Partido Da`wah Islâmico e de editor do jornal Al-Adhwah.

Depois de sua saída, Assadr limitou-se ao modo tradicional de vida da Hawza, evitando atividades que pudessem por em risco sua posição de Marje`. Ele chegou até mesmo a atrasar a publicação de seu muito esperado livro, Mojtamauna (Nossa Sociedade), porque, de acordo com algumas fontes, a época não estava madura para tal obra. Contudo, segundo os membros do partido Da`wah Islâmico, Assadr manteve contato com o partido através de seus alunos. Quanto ao jornal, o destacado Ayatullah Mohammad Hussein Fadlullah (D.D.) afirma que Assadr encorajou-o para que escrevesse os editoriais.

A paixão de Assadr por reforma estava então dirigida para a Hawza. Primeiro, era necessário modernizar seu currículo. No decorrer de um século e meio, a Hawza de Najaf Al-Ashraf tinha enfatizado somente o Fiqh e o Usul Al-Fiqh, pois estas matérias eram as que haviam tornado a Hawza notável, sendo assim, outros estudos Islâmicos eram considerados de menor, ou até mesmo, sem importância, e os professores da Hawza davam pouca atenção a eles. Assadr também estava preocupado com a freqüência irregular dos estudantes e com a negligência dos mesmos em relação aos estudos. Ele entendia que os estudantes deviam completar seus cursos com distinção antes que pudessem reivindicar a posição de sábios religiosos, e propôs um novo livro de texto argumentando que os velhos livros não tinham sido escritos para estudantes. Um livro texto, de acordo com Assadr, deve levar em consideração a capacidade dos alunos para compreenderem o assunto, gradualmente partindo de seus conceitos básicos para os seus avanços mais recentes.

O plano de Assadr adotava não somente o uso de livros-texto do tipo utilizado pelas instituições acadêmicas modernas, mas também o estabelecimento do estilo ocidental das universidades que encarregaria ao estudante a responsabilidade de completar certos cursos e de ser aprovado em exames regulares. Para implementar suas reformas Assadr auxiliou a formação do Colégio Usul Al-Din, em Bagdá, no ano de 1964, e montou seu currículo. Mais tarde, escreveu três livros-texto sobre o Alcorão Sagrado, Usul Al-Fiqh e economia Islâmica para o primeiro e o segundo ano do nível médio. Todavia, seus esforços para realizar suas reformas na Hawza enfrentaram uma resistência tenaz por parte dos estudantes e da própria instituição.

Os anos de 1964 a 1968 foram uma “época de ouro” para a política xiita moderna, primeiro porque o regime Ba`ath e Arif sentiam-se em débito com os estabelecimentos religiosos xiitas por sua ajuda na tarefa de desacreditar e derrubar Qasim, e segundo porque o novo regime ganhava legitimidade dos líderes xiitas que apoiaram o endurecimento do regime sobre as forças comunistas no país. A relativa liberdade que os xiitas gozavam naquele período resultava da contínua luta entre o Ba`ath e Arif, entre os árabes nacionalistas e os comunistas, e entre os próprios partidários do Ba`ath. O regime estava tão preocupado com sua luta interna que fazia vistas grossas às atividades políticas dos xiitas, embora mais tarde, tenha expulsado os xiitas dos poucos postos governamentais que tinham ganhado sob o governo de Qasim.

Livre da interferência do governo, o Partido Da`wah Islâmico aumentou o número de seus membros nas universidades e entre os intelectuais. De acordo com as fontes do Partido, mais de 1500 exemplares do periódico oficial, porém clandestino, do partido, o Awt Al-Da’wah, foram distribuídos a membros e apoiadores apenas na Universidade de Bagdá. Os estudantes manifestaram seu comprometimento numa marcha conhecida como “A Procissão dos Estudantes”, em Karbalá, na cerimônia anual do Martírio do Imam Hussain (A.S.).

Ayatullah Mohsen Al-Hakim (K.S.) expandiu sua influência com a crescente matrícula na Hawza de Najaf e com o desenvolvimento dos planos de estabelecer uma academia xiita com o estilo ocidental de ensino em Kufa, onde uma educação secundária se tornaria disponível para jovens xiitas que algum dia seriam influentes nas questões políticas. Ele também fundou novos centros religiosos e bibliotecas em várias cidades iraquianas, dirigidos por missionários conhecidos como wukala’ (representantes). Os sábios religiosos de Bagdá e Cadhemiah organizaram uma associação similar à Jama’t al-Ulamah de Najaf, conhecida como a Hayat Jama’at Al-Ulamah fi Baghdad wal Kadzimyyah.

O confronto com o Partido Ba`ath.

A chegada do Partido Ba`ath ao poder em 17 de Julho de 1968, iniciou uma nova fase no conflito entre os líderes xiitas, Ayatullah Asayyed Mohsen Al-Hakim e Sayyed Mohammad Baquer Assadr (K.S.), e o governo central em Bagdá. O regime enfrentava dois lideres que tinham carisma e influência política, Al-Hakim através de sua simbólica liderança sobre os xiitas ao redor do mundo, e Assadr através de sua influência sobre o Partido Da`wah Islâmico. A estabilidade do novo regime dependia de uma confrontação para com eles. Sua primeira medida para limitar o poder dos xiitas foi interromper suas atividades religiosas, o que incluía: o fechamento das escolas primárias e secundárias de Jawadayn e do colégio Usul Al-Din de Bagdá; o confisco da propriedade e dos fundos reservados para a construção da Universidade de Kufa; o fechamento do Risalat al-Islam, o único jornal religioso que o governo autorizava circular naquela época; a proibição da procissão dos estudantes em Karbalá; a expulsão de centenas de estudantes não-iraquianos da Hawza em Najaf; e a aprovação de uma lei que requeria que os iraquianos freqüentadores da Hawza alistassem-se nas forças armadas.

As lideranças xiitas pareciam estar desorganizadas e o Regime Ba`ath pegou-as de surpresa. Desatentos ao plano dos ba’athistas para eliminar a estrutura política da comunidade xiita, seus líderes se encontraram para deliberar sobre meios pacíficos para negociar com o governo e decidiram realizar um protesto público. O Conselho Supremo Xiita sugeriu que Ayatullah Asayyed Mohsen Al-Hakim (K.S.) visitasse Bagdá para mobilizar o apoio xiita contra o governo. Al-Hakim se instalou em Cadhemiah para receber os apoiadores, Assadr foi ao Líbano para organizar um protesto do exterior e usar o escritório do Conselho Supremo Xiita, liderado por seu primo, Sayyed Mousa Assadr para fazer uma campanha contra o governo Iraquiano. Sayyed Mousa Assadr enviou telegramas para os líderes dos estados Islâmicos e para os grupos Islâmicos diversos, chamando a atenção para o assédio do governo Ba`ath às lideranças religiosas de Najaf. O resultado desses esforços foi decepcionante. Apenas Jamal Abdel Nasser, presidente do Egito, rei Faisal da Arábia Saudita, Iriyani do Yêmen do Norte, e os Jama’at Al-Islam de Abu Ala` Mawdudi do Paquistão deram algum apoio moral, mas ninguém agiu.

Ao retornar para o Iraque, Sayyed Mohammad Baquer Assadr, com a cooperação da Jama’at de Najaf e o Ha’yat de Bagdá e Cadhemiah, organizou um encontro público no Santuário de Imam Ali (A.S.) em Najaf Al-Ashraf para apoiar Al-Hakim e condenar a ação do governo Ba`ath. A declaração, que foi lida à audiência por Mahdi Al-Hakim, foi redigida por Assadr.

A medida seguinte tomada contra o governo, de acordo com Murtada Al-Askari, foi organizar uma demonstração em massa em Bagdá, em apoio a Al-Hakim. Porém, antes que o plano fosse levado a cabo o governo Ba`ath anunciou que Mahdi Al-Hakim estava conspirando para derrubar o governo através de um golpe militar com o apoio de alguns generais e empresários xiitas que tinham ligações com o Irã e o Ocidente (querendo dar a entender com isso, EUA e Israel). Esta acusação pôs os líderes xiitas na defensiva e diluiu seu apoio. Mahdi Al-Hakim foi expulso do país, Al-Askari foi para o Líbano, e Ayatullah Mohsen Al-Hakim retirou-se para Najaf, onde morreu poucos meses depois. Seu sucessor Ayatullah Khoei, o mentor de Assadr, refreou-se de tomar qualquer atitude contra o Governo Ba`ath.

Depois que Ayatullah Mohsen Al-Hakim faleceu, o governo Ba`ath intensificou seus esforços para reduzir a influência da Hawza de Najaf, expulsando os estudantes não-iraquianos (a maioria dos estudantes era estrangeira) e monitorando os iraquianos. Isto lançou a Hawza no caos. Para manter os estudantes não-iraquianos no país, de modo que pudessem auxiliar a resistência ao governo, Assadr convenceu ao Ayatullah Khoei a emitir uma ordem aos estudantes para que permanecessem em Najaf Al-Ashraf e continuassem seus estudos. O governo Ba`ath, não desejando se opor ao novo Marje` dos xiitas, Ayatullah Khoei, que era considerado como se estivesse acima da política, adiou o implemento de sua política de deportação. O regime começou a então adotar medidas repressivas em relação ao Partido Da`wah Islämico. Muitos membros do partido que eram suspeitos foram detidos em 1972 e sentenciados de um a cinco anos de prisão. Abdel-Saheb Al-Dakheili, conhecido como Abu Isam, morreu submetido a tortura em 1973.

Ele foi o organizador da procissão estudantil em Karbalá e também se acredita que tenha sido o líder do partido Da`wah Islâmico em Bagdá. Um ano mais tarde, por volta de 75 membros do Partido, alguns dos quais sábios religiosos, foram detidos pelas forças de segurança, e cinco, que se acredita terem sido os líderes do partido, foram sentenciados à morte pela corte revolucionária.

Com a sentença dessas pessoas, algumas delas sábios religiosos, surgiu um clamor e uma condenação pública por parte das instituições religiosas, incluindo Ayatullah Khoei, Imam Khomeini e Sayyed Assadr. A fim de evitar um precedente para a execução de sábios religiosos da Hawza, Assadr emitiu um decreto religioso proibindo aos estudantes e sábios da Hawza de aderirem a qualquer partido político. Neste mesmo ano, o próprio Assadr foi detido para interrogatório pelas forças de segurança e levado de Najaf Al-Ashraf para Bagdá, mas logo foi libertado.

Na era pós-Hakim, Assadr era reconhecido na Hawza como um Marje`, e o herdeiro em potencial do Grande Marje` Ayatullah Khoei. Todavia, estava ciente que a Marja`yyah, a única fonte verdadeira de liderança política dos xiitas, carecia de um fundamento institucional adequado, muito embora tivesse um milênio de idade. Em particular, carecia de meios para impor decisões sobre a totalidade dos sábios religiosos. De modo adicional, tradicionalmente o Marje` adotava políticas e chegava a decisões utilizando um circulo interno formado por associados próximos e membros familiares, para assim reunir informações, emitir declarações e distribuir os fundos religiosos. Não havia qualquer procedimento formal para a tomada de decisões ou o planejamento de estratégias a longo prazo, e isso freqüentemente resultava em confusão, o que enfraquecia o relacionamento entre os Marje` e o povo.

Para aumentar o poder dos Marje`, Sayyed Assadr procurou, como ele disse, transformar o que chamava de “Marja`yyah subjetivo” num “Marja`yya objetivo”. O Marje`, segundo Assadr, devia conduzir seus assuntos e guiar seu povo usando uma estrutura organizada. Para conduzir os assuntos da comunidade Islâmica, o Marje` deveria formar comissões, as quais serviriam para dirigir os assuntos educacionais da Hawza, auxiliando os estudos Islâmicos e a pesquisa, e escrevendo sobre as matérias essenciais, cuidar dos assuntos dos sábios que representavam o Marje` em outras cidades, ajudar o movimento Islâmico e finalmente, administrar os assuntos financeiros.

Entretanto, naquele tempo Assadr não estava pronto para formar a estrutura institucional do “Marja`yyah Objetiva” porque ele não era o Marje` Supremo, a autoridade simbólica de todos os xiitas, uma posição que daria a ele o poder religioso e financeiro para realizar tais mudanças. A publicação do Al-Fatawa Al-Wadiha, livro sobre jurisprudências e legislação religiosa islâmica, tencionava anunciar sua Marja`yya, e preparar a ele próprio e os contendores de Najaf e Qom, na maneira tradicional de suceder ao Ayatullah Khoei, o Grande Marje`.

Sayyed Assadr também tinha uma motivação política por trás de seu primeiro e indireto anúncio de interesse ao Marja`yya. Ele pensou que isso o protegeria da perseguição governamental. Uma vez que fosse um Marje`, Assadr acreditava que o governo pouparia sua vida a despeito de sua posição política, porque os regimes do Iraque e do Irã não executavam juristas de destaque. Um caso em questão era a decisão do Shah em não executar o Imam Khomeini depois que um este destacado Marje` de Qom emitiu uma declaração proclamando Khomeini como um deles. Ao invés disso, o Shah expulsou Imam Khomeini do Irã. Anunciando seu Marja`yya, de certo modo Assadr pensava que estava a ganhar uma imunidade política.

Com a publicação do Al-Fatawa Al-Wadiha, os membros do Partido Da`wah Islämico e seus admiradores, a maior parte formada por estudantes e intelectuais, começaram a referir-se ao Assadr como seu Marje` e líder. No início de 1977, o regime Ba`ath tomou a medida mais ousada de repressão aos xiitas até o momento, foi quando proibiu as cerimônias anuais do martírio do Imam Hussain (A.S.). O regime tinha tentado proibi-las desde 1970, em Najaf e Karbalá, mas não obteve sucesso anteriormente.

Naquele ano, a liderança do Ba`ath estava determinada a usar de quaisquer meios necessários para interromper a tradicional procissão de Najaf a Karbalá, um evento que gera um considerável fervor religioso. Milhares de xiitas de todo o Iraque participam da peregrinação, os quais costumeiramente levam quatro dias para percorrer por volta de cem quilômetros. A procissão era vista pelo regime como um obstáculo a sua política de secularismo e como um meio de prover apoio popular às autoridades religiosas.

A proibição da procissão em 1977 provocou tumultos em Najaf. Os organizadores distribuíram folhetos que conclamavam o povo a participar no desafio às autoridades do governo e a proteger seus direitos religiosos. As audições públicas organizadas pelo Partido Ba`ath e o governador de Najaf não acalmaram a tensão, ao contrário, precipitaram o caos. Uma multidão estimada em 30.000 pessoas iniciou a procissão carregando bandeiras estampadas com versículos do Alcorão Sagrado, tais como “O Poder de Deus está acima do deles” e “O triunfo virá da parte de Deus”.

Frente a esse desafio, o regime primeiro se reuniu com os líderes da procissão e recorreu à ajuda de Sayyed Mohammad Baquer Al-Hakim, que informou aos xiitas que o regime estava disposto a quitar a proibição da procissão se os agitadores parassem de cantar os slogans anti-governamentais. Porém, os sentimentos de repúdio ao Partido Ba`ath naquela altura já estavam tão exaltados, que era impossível um compromisso. O governo, de sua parte, mobilizou uma brigada militar com tanques, helicópteros e aviões para bloquear o caminho para Karbalá. Centenas de manifestantes conseguiram adentrar a cidade, pois muitos oficiais e soldados eram simpáticos à causa e não estavam dispostos a obedecer às ordens do governo que os instruiu a atirar nas pessoas que cantassem slogans religiosos. O governo mobilizou então a segurança do partido Ba`ath e a polícia, para reprimir a procissão nas ruas de Karbalá, e para deter o máximo de pessoas possível. Centenas foram presas e muitas foram feridas.

Em seguida, o governo formou uma corte revolucionária especial para julgar os réus, encabeçada por três destacados dirigentes do Partido. Sete pessoas foram sentenciadas a morte, e quinze, incluindo Sayyed Mohammad Baquir Al-Hakim, à prisão perpétua. O incidente também causou uma cisão dentro da própria liderança Ba’athista. Alguns membros importantes do partido julgaram a ação demasiadamente severa, e pareciam hesitar em tomar uma atitude violenta. Um grupo extremista liderado pelas facções Bakr-Saddam venceu, expulsando o grupo moderado, inclusive os membros da Corte Revolucionária, do Governo e das demais posições que tinham no Partido.

O regime suspeitava que Sayyed Assadr tivesse tido participação na manifestação. Ela tinha sido muito bem orquestrada, o que sugeria que o Partido Da`wah Islâmico estava por trás da organização. Al-Hakim, o líder do grupo que negociou com os agitadores, era um discípulo e representante pessoal de Assadr. Seu fracasso em conseguir concessões por parte dos agitadores, que eram ligados ao Partido Da`wah Islâmico, a principal organização de Assadr, era um dos sinais que faziam o regime suspeitar que Assadr liderava uma conspiração nos bastidores. As forças de segurança do Partido Ba`ath detiveram Assadr e enviaram-no à Bagdá para interrogatório, mas o soltaram quando o povo exigiu sua libertação, a fim de não instigar uma outra revolta por parte da Hawza.

O confronto com o Regime Ba`ath: o Episódio final.

Os dirigentes do Ba`ath pensaram que suas medidas de 1977 iriam por um fim na oposição religiosa, mas a Revolução no Irã, em 1978, reacendeu os esforços dos xiitas, e uma revolução liderada por clérigos de Najaf estava sendo armada contra o Shah iraniano. A capital xiita estava outra vez no centro do cenário, embora desta vez a ação não fosse dirigida contra o Ba`ath, ainda era preocupante para o regime iraquiano. O Imam Khomeini (K.S.), líder do levante iraniano, tinha vivido em Najaf por quatorze anos. Ele se beneficiou da inimizade do Ba`ath em relação ao Shah para lançar uma campanha contra este no Irã a partir do Iraque. Teve acesso à rádio iraquiana para transmitir suas mensagens, e isto lhe tornou possível aproximar-se de seus colaboradores políticos. Contudo, tais favores não fizeram surgir nenhum sentimento pró-Ba`ath por parte de Imam Khomeini (K.S.). Ele tinha testemunhado as medidas repressivas do regime Ba`ath contra a Hawza de Najaf e contra os líderes xiitas.

A revolução iraniana parecia demonstrar que um regime opressivo, dirigido por um aparato de segurança muito bem estabelecido e apoiado pela espionagem ocidental, podia de fato ser desafiado e derrotado, e que a ideologia Islâmica era capaz de liderar as massas para que estabelecessem o tão sonhado estado Islâmico. Demonstrava-se que o sangue sacrificado durante a revolução poderia encorajar outras pessoas devotadas à causa do Islam. As medidas repressivas do regime poderiam ser transformadas em meios para atingir a vitória. A Revolução Islâmica do Irã apresentava um cenário político atraente aos revolucionários Muçulmanos que o desejassem seguir, e a comunidade xiita iraquiana era a primeira a imitá-la.

Sayyed Assadr fez vários movimentos políticos calculados, porém discretos, que não contrariavam o regime iraquiano, mas que mostravam seu comprometimento e o seu apoio à Revolução Islâmica no Irã. Primeiro, ele enviou um longo pronunciamento ao povo iraniano enquanto Imam Khomeini se encontrava em Paris, declarando seu apoio e elogiando o levante. Depois que Imam Khomeini retornou ao Irã, Assadr enviou Sayyed Mahmoud Al-Hashemi, um de seus discípulos mais próximos, ao Irã como seu representante. Ambas as ações foram consideradas pelo regime iraquiano como claras violações da política do governo de “esperar para ver”.

Além disso, Assadr, contrário à política do governo Ba`ath que instigava e apoiava a revolta da população árabe no Irã, tinha pedido aos árabes para que apoiassem o estado Islâmico, que por fim, garantiria seus direitos políticos e étnicos. Em uma de suas mensagens ao povo iraniano, Assadr conclamava os árabes do Irã a obedecerem aos líderes da revolução, porque a república Islâmica representava o estado fundado pelo Profeta Mohammad (S.A.A.S.), onde pessoas de diferentes nacionalidades e etnias podiam viver com tranqüilidade total.

Então, Sayyed Assadr publicou seus ensaios que tratavam da fundação do estado Islâmico, os quais mais tarde foram reunidos sob o título de Al-Islam Yaqud Al-Hayat (O Islam lidera a Vida). Um deles tratava das bases religiosas para a formação de um governo Islâmico. Neste tratado, Assadr delineou a estrutura de um estado Islâmico, as funções de cada um de seus ramos de governo, as responsabilidades do Marje` no estado, e a legitimidade de sua absoluta autoridade de acordo com o Xiismo. O tratado parece ter tido um grande impacto sobre os autores da constituição da República Islâmica do Irã. É possível se encontrar muitas idéias e pontos de vista de Sayyed Assadr sobre a estrutura de um estado Islâmico na redação final deste documento. Os outros cinco ensaios abordavam os princípios do estado Islâmico e a estrutura de sua economia, utilizando idéias similares às que ele tinha apresentado em seus trabalhos produzidos vinte anos antes, prova da coerência destes ensaios com seu primeiro Ijtihad.

A atitude mais corajosa do Sayyed Assadr contra o regime foi emitir um decreto religioso proibindo aos Muçulmanos de se filiarem ao Partido Ba`ath ou aos seus órgãos aliados, uma medida tão perigosa que mesmo alguns dos seus representantes em várias cidades iraquianas hesitaram em publicá-la, pois temiam por sua própria segurança e pela vida de Assadr. Para tornar o conteúdo desse decreto religioso conhecido, Assadr recorreu a outros meios, tais como encorajar seus estudantes a o inquirirem sobre a participação no Partido Ba`ath durante seus sermões regulares na Hawza.

Depois disso, as pessoas esperavam uma severa medida a ser tomada contra Assadr, mas as relações entre ele e o regime permaneceram inalteradas. Ao invés disso, a última gota na taça foi adicionada pelo Irã. Imam Khomeini (K.S.), confiando em suas fontes de Najaf Al-Shraf, transmitiu uma mensagem a Assadr pedindo que permanecesse na Hawza e não partisse do Iraque a despeito do assédio do governo. Muito embora Assadr enfrentasse o risco de prisão e a possibilidade de execução, ele não estava de qualquer modo planejando deixar o Iraque. A mensagem do Imam Khomeini (K.S.), e a resposta de Assadr, que foram ouvidas por milhões de pessoas do Iraque, iniciaram uma onda de manifestações públicas em várias cidades iraquianas, em apoio a Assadr e em louvor a Imam Khomeini. Najaf Al-Ashraf era a cidade mais turbulenta, havia delegações de todo o Iraque chegando para as manifestações, e para serem recebidas por Sayyed Assadr.

Assadr ordenou aos seus seguidores que parassem com as manifestações, já que eles representavam o âmago de seu apoio, ele não desejava que se expusessem ao regime e achava necessário que estivessem seguros das futuras medidas de endurecimento do regime. Ele afirmou a um dos membros do Partido Da`wah Islâmico que a momentânea “aquiescência do regime” revelava um grande perigo oculto, sendo assim, se deveria adotar precauções e muita prudência na ação.

E como Assadr havia percebido, o Governo começou a repressão: os representantes de Assadr e centenas de membros do Partido Da`wah foram detidos e encerrados ou executados. Em seguida, o próprio Assadr foi detido e levado para Bagdá. Sua irmã, Aminah Assadr, conhecida como Bent Al-Hoda, dirigiu-se ao Santuário do Imam Ali ibn abi Taleb (A.S.) e proferiu um violento discurso, incitando o povo a manifestar-se contra o Governo e a proteger seu líder. Como as notícias da prisão de Assadr se espalharam, tumultos irromperam em Bagdá, Basra, Diyala, Samawa, Kut, Diwaniyyah, Karbalá e outras cidades. O mercado de Najaf baixou as portas e multidões iradas entraram em conflito com a polícia. A cidade inteira parecia sob cerco já que o governo aumentou suas medidas de segurança. A expansão da violência no país forçou o regime a libertar Assadr no dia seguinte.

A detenção do Sayyed Assadr deu ao regime Ba`ath uma clara idéia da extensão de seu apoio. Sua oposição ao regime tinha feito dele um líder nacional e um galvanizador da opinião pública, e sua presença tinha se tornado uma ameaça à sobrevivência do regime. Portanto, os ba’athistas determinaram-se a separá-lo de seus aliados e da totalidade do Partido Da`wah Islâmico. Ativistas Muçulmanos foram presos em massa, torturados e executados, e as mesquitas onde os sábios religiosos pregavam foram fechadas. Até mesmo alguns sábios proeminentes que comumente cooperavam com o regime e apoiavam sua política foram detidos. A política do regime não poupou nenhuma força religiosa xiita do país. Os documentos governamentais mostram que a Corte Revolucionária decretou 258 sentenças de morte em vinte e dois julgamentos. O próprio Assadr foi colocado em prisão domiciliar, na qual o regime tentava extrair concessões dele. Durante seu interrogatório, em Agosto de 1979, Fadil Al-Barak, o chefe do serviço de segurança, exigia que ele fizesse uma declaração pública denunciando a Revolução Islâmica iraniana e apoiando a política iraquiana em relação ao Irã. Quando Assadr se recusou a suavizar sua linguagem para com o regime, um novo mediador, Sheikh Issa Al-Khaqani, foi enviado para pedir a ele que cumprisse ao menos uma das cinco condições seguintes com o intuito de que sua vida fosse poupada: abandonasse seu apoio ao Imam Khomeini e ao regime iraniano, ou emitisse uma declaração apoiando uma das políticas governamentais, tais como a nacionalização das companhias estrangeiras de petróleo e a autonomia nacional para os curdos, ou emitisse um decreto religioso proibindo a associação com o partido Da`wah, ou ainda, desse uma entrevista a um jornal iraquiano ou árabe que fosse ligado ao regime iraquiano. A esta altura, Sayyed Assadr, de acordo com seu secretário particular, Sheikh Al-Nu’aini, tinha concluído que seus dias estavam contados, e decidiu rejeitar todas as exigências do governo, ao perceber a aproximação de seu martírio.

Ele respondeu a Al-Khaqani, o mediador do regime:

“A única coisa que tenho buscado em minha vida é tornar possível o estabelecimento de um governo Islâmico na Terra. Já que ele foi formado no Irã sob a liderança do Imam Khomeini, não me faz diferença para estar vivo ou morto, pois o sonho que eu queria realizar e a esperança que eu queria atingir tornou-se realidade, Graças a Deus!”

Quando os grupos Islâmicos, o partido Da`wah e a Organização Ação Islâmica de Al-Shirazi e os irmãos Modarresi, viram que o regime perseguia seu líder, levantaram armas contra os oficiais do Ba`ath. Atacaram o ideólogo do Partido Ba`ath, Tarik Aziz, então ministro das relações internacionais, na Universidade Mustansiryyah. Tarek Aziz estava supostamente discursando sobre a política do regime em relação ao Irã para os membros do Ba`ath entre o corpo estudantil da universidade. Os ativistas Muçulmanos lançaram uma bomba em Tarek Aziz, ferindo-o e matando vários de seus guarda-costas. No funeral público dos guardas uma outra bomba foi atirada na procissão fúnebre, matando várias pessoas. Pela primeira vez o regime enfrentava a resistência que estava minando seu apoio entre os xiitas. Saddam Hussein, naquele momento o novo presidente da república, durante uma visita àqueles que tinham sido feridos em Mustansiryyah, pediu por vingança contra os autores do atentado. A velha tática do regime, de rotular a luta armada dos Muçulmanos como trabalho dos elementos iranianos no país, não mais convencia, pois as atividades anti-governamentais dos Muçulmanos continuavam a crescer mesmo depois que mais de 130.000 iraquianos de origem iraniana tinham sido deportados para o Irã. Além disso, Assadr, o símbolo do movimento Islâmico, pertencia a uma conhecida família iraquiana. O que o regime Ba`ath precisava era liquidar o movimento Islâmico como um todo. Em 31 de Março de 1980, o Conselho do Comando Revolucionário aprovou uma lei sentenciando à morte todos os membros do Partido Da`wah Islâmico, tanto do presente quanto do passado, e também os membros de suas organizações afiliadas e as pessoas que trabalhassem por seus objetivos. Tal lei eliminou qualquer possibilidade de se poupar a vida do Sayyed Assadr.

Enquanto estava sob prisão domiciliar Assadr enviou clandestinamente três mensagens para seus associados, convocando o povo iraquiano a resistir ao regime de toda maneira possível. Nestas mensagens, ele falava como líder do povo e em nome do povo, e exigia o governo político e os direitos religiosos para todo o povo, xiitas e sunitas, árabes e curdos. Ele ainda apelava aos membros do Partido Ba`ath, cujo ao líder ele acusava de violar os princípios do próprio partido. Desafiou a direção do Partido Ba`ath a permitir ao povo, por apenas uma única semana, que expressasse sua hostilidade ao regime. Em uma dessas mensagens, Assadr lançou um ultimato visando a derrubar o regime e estabelecer um governo Islâmico:

“É dever de cada muçulmano no Iraque e de cada iraquiano no exterior fazer tudo o que lhe seja possível, mesmo se isso custar sua vida, manter o Jihad e a luta para remover este pesadelo do querido Iraque, para libertar eles próprios desta gangue desumana, e estabelecer um governo justo, singular e honorável, baseado no Islam”.

Em 09 de Abril de 1980, Sayyed Mohammad Baquer Assadr e sua irmã foram injustamente executados pelo regime do Iraque, após terem sido presos três dias antes e levados ao quartel general da Agência Nacional de Segurança, em Bagdá. Nesta fatídica data, os corpos foram trazidos a Najaf Al-Ashraf durante a noite, em uma situação de muito terror e medo, pois toda a energia elétrica da cidade foi cortada, e ambos, foram entregues ao seu tio, Sayyed Mohammad Sadiq Assadr. Se preparando para combater qualquer possível revolta popular, o Exército e a Agência Nacional de Segurança cercaram a cidade de Najaf Al-Ashraf com tanques e soldados, ao mesmo tempo em que, na mesma noite, os dois mártires foram enterrados em segredo no cemitério Vale da Paz (Wadi Assalam), em Najaf Al-Ashraf. No entanto, a divulgação pública de seu martírio só se deu semanas depois.

E com o seu martírio, o mundo Islâmico e o povo Iraquiano perderam algo que nunca foi ou poderá ser compensado, perderam uma bandeira entre as bandeiras do movimento e do conhecimento Islâmico, e um grandioso sábio. Após o martírio do Sayyed Assadr, juntamente com sua irmã, ocorreram centenas de manifestações pelo mundo, condenando e repudiando o ato bárbaro e criminoso cometido por Saddam Hussein. O martírio de Assadr foi declarado e sentido pelas escolas Islâmicas e por um grande numero de sábios e eruditos, entre eles o Ayatullah Al-Odhma, líder da Revolução Islâmica no Irã, Sayyed Al-Khomeini (K.S.), o qual declarou luto oficial por três dias. A respeito do fato o Imam al-Khomeini (K.S.) fez a seguinte declaração:

Em nome de Deus, o Clemente, o Misericordioso.

“Todos somos de Deus, e a ele retornamos”.

Com muita tristeza, foi citado através do relatório do Ministro das Relações Exteriores, o qual foi resultado de várias fontes especializadas dos países Islâmicos; que o Ayatullah Mártir Assayed Mohammad Baquer Assadr e sua irmã inocente, atingiram o grau de mártires pelas mãos do regime Ba`athista opressor do Iraque, e isso se deu de uma forma bárbara e trágica.

O martírio é uma tradição atingida por grandes personalidades da história iguais a estas, e o crime e a injustiça também é uma tradição perpetuada pelos injustos e opressores da história.

Não devemos nos estranhar com o martírio destes seres grandiosos, que fizeram de suas vidas meios do Jihad pela Causa Divina objetivando intenções Islâmicas, martirizados por pessoas corruptas e criminosas, que passaram suas vidas a sugar o sangue dos demais. O estranho é quando os sábios grandiosos morrem numa cama e sem que os governantes injustos sujem suas mãos com o sangue deles.

Não é estranho que o Mártir Assadr e sua irmã inocente sejam martirizados, mais o estranho é que a Nação Islâmica, e especialmente o povo honrado do Iraque, as tribos do Tigre e Eufrates, os jovens universitários e os queridos jovens do Iraque passem por estas grandes tragédias, que atingem o Islam e os Ahlul Bait (A.S.), e não aproveitem o momento para combater e tirar o espaço do Partido opressor Ba´ath, o partido amaldiçoado que mata os seus lideres.

Os mais estanhos entre todos são o exercito iraquiano e as forcas do regime, que se deixam ser instrumentos nas mãos dos criminosos, os ajudando para a destruição do Islam e do Alcorão Sagrado.

Estou decepcionado com os grandes comandantes militares, mas não estou decepcionado com os sargentos e os soldados, e o que peço deles é: ou se revolucionam livremente e com coragem, e acabam com as estruturas da injustiça, como aconteceu no Irã, ou deserdem e saiam das bases militares e seus postos, pois se não fizerem isso, serão culpados pelas opressões do Partido Ba´ath.

Não estou decepcionado com os funcionários e trabalhadores do regime corrupto Ba´th, e tenho a esperança de que dêem as mãos ao povo iraquiano para eliminar esta opressão que paira sob a pátria iraquiana.

Peço a Deus, o Todo Poderoso, que este injustos possam descobrir a face da opressão e do crime do Iraque.

Declaro três dias de luto, iniciando na terceira Quarta-feira do mês de Ordibehesht (23 de Abril), e declaro feriado até a Quinta-feira. E isto, como uma forma de respeito e consideração a esta grandiosa personalidade cientifica, a este empenhado Mojahed, que era um motivo de orgulho e honra para a Hawza, o qual foi um dos eruditos, sábios e pensadores do Islam.

Peço a Deus, o criador do Universo, que possa nos compensar nesta grande perca que recai sobre o Islam e os Muçulmanos.

Que a paz esteja sobre os Seus fieis servos”

2 de Ordibehesht de 1359 / 23 de Abril de 1980
Ruhollah Al-Musawi Al-Khomeini

Algum tempo após o enterro de Sayyed Mohammad Baquer Assadr, o governo planejou a destruição e eliminação do seu túmulo. Por isso, a pessoa que o enterrou foi atarefada de transferi-lo a outro local, para que fosse enterrado novamente. Isso se manteve em segredo, e depois de 23 anos, em 09 de Abril de 2003, o local de seu enterro foi exposto e divulgado para a população, pois se temia os planos de destruição do túmulo sagrado e abençoado do Sayyed Assadr.

Depois do seu martírio houve uma época sangrenta, que atingia o povo e toda a região, a qual se iniciou e desenvolveu com:

1 – A criação de diversas células de espionagem ligadas à Agência Nacional de Segurança do Iraque, e implantação das mesmas em todos os locais.

2 – A deportação de milhares de famílias iraquianas, o que foi pretensamente justificado pelo fato de que os deportados se originavam do Irã e não eram bem vindos no Iraque.

3 – O confisco de todos os bens, móveis e imóveis, dos perseguidos e deportados.

4 – A perseguição, prisão, tortura e execução de milhares de fieis, entre homens e mulheres, nas prisões iraquianas. O número dos executados passa dos 400 mil mártires, os quais tiveram seus nomes divulgados, e os quais entre eles 250 mil eram acusados de serem membros ou ligados ao Partido Da`wah Islâmico. Isso seguia o decreto 461 decretado em 31 de Março de 1980, que condenava à execução qualquer membro ou associado do Partido Da`wah Islâmico.

5 – A utilização de armas químicas por parte do regime iraquiano, contra os curdos no norte do Iraque, na região de Halab-shah e em cidades vizinhas, as quais mataram mais de 10 mil pessoas. Isso atingiu as regiões onde se residam os Turkuman, no norte do Iraque, como as regiões de Bashir e Tos-Khormato.

6 – A guerra do regime iraquiano contra o Irã, que se iniciou em 22 de Setembro de 1980, e durou oito anos. Nesta guerra centenas de milhares de pessoas morreram ou foram feridas, e a infra-estrutura e espaços naturais de ambas as nações vizinhas e irmãs foi destruída.

7 – A invasão do estado vizinho do Kuwait, no ano de 1990, e a sua ocupação por certo período, o que se seguiu com a invasão de algumas regiões do Reino da Arábia Saudita.

8 – Em 02 de Março de 1991 iniciou-se a Intifada Iraquiana, data equivalente a 15 de Chaban do ano de 1411 Hejirita. Esta foi uma Intifada grandiosa do povo iraquiano contra o governo injusto e tirano do regime de Saddam Hussein. Esta intifada resultou na conquista de quatorze estados iraquianos pelos revolucionários Islâmicos e patriotas. Saddam Hussein extinguiu esta intifada brutalmente, matando e cremando as pessoas, os cortava em pedaços, colocando-os nas prisões, os torturando e perseguindo até matar centenas de milhares deles, sendo que alguns chegava mesmo a enterrar vivos, e chegando a criar mais de 300 valas comuns clandestinos em todo o Iraque.

9 – Perseguição e cerco a um grande número de sábios e eruditos, entre eles o Ayatullah Assayed Abul Qasem Al-Khoui (K.S.) e execução do Ayatullah Borujerdi (K.S.), Ayatullah Al-Gharawi (K.S.), dois dos filhos do sábio Ayatullah Al-Khoui (K.S.) e do grande sábio Ayatullah Mohammad Mohammad Sadiq Assadr (K.S.) e dois de seus filhos, mais a perseguição de centenas de líderes, sábios e estudantes da Hawza iraquiana.

10 – A perseguição dos políticos que se opunham ao governo de Saddam Hussein, mesmo se fosse em algo mínimo e insignificante, e mesmo se fossem membros do partido Ba´th.

11- A criação de diversas crises para fazer com que as pessoas se ocupassem com isso, colocando o medo nelas e as pressionando.

Depois destes sofrimentos e outras centenas de aflições, se iniciou a terceira guerra do golfo, a qual resultou na queda do regime tirano de Saddam Hussein, o qual teve o seu partido derrotado. Isso ocorreu no dia 09 de Abril de 2003, na mesma data em que foi martirizado o Ayatullah Assayed Assadr, 09 de Abril do ano de 1980, ou seja, vinte e três anos depois.

Este foi o ultimo capítulo da vida de Saddam Hussein, o homem que abriu as portas do Iraque à desordem e ao prejuízo, que fazem o Iraque sofrer até o presente momento devido às agruras do passado injusto e opressor de um regime corrupto e assassino.

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