Os Jovens da Caverna: o afastamento do desvio e o ingresso nele (Narrativas Alcorânicas)

1ª Cena

Samud é o povo do profeta Sálih (a.s.), a quem Deus ordenou que deixassem a fêmea do camelo beber água um dia e ele, outro. Porém, o povo de Samud desobedeceu a ordem divina e matou o animal, injustamente. Isso é relatado pelo Alcorão: “Respondeu-lhes: Eis aqui a fêmea de camelo, que tem direito à água, assim como vós tendes o vosso direito, num dia determinado. Não lhe causeis dano, porque vos açoitará o castigo do Dia Terrível. Porém, a esquartejaram, se bem que logo se arrependeram. E o castigo os açoitou. Sabei que nisto há um sinal; porém, a maioria deles não crê.” (26:155-158).

2ª Cena

Em um lugar qualquer havia um governante e seu povo, que adoravam os ídolos. O governante obrigava as pessoas a adorar aquelas imagens. Porém, um grupo de jovens crentes rejeitou isso. Uma vez que o governante era tirano e castigava quem não o obedecia, eles pediram a Deus que lhes concedesse um local para se retirar e procurar uma saída da situação crítica em que se encontravam. Ele os guiou a uma caverna. Porém, a vontade de Deus determinou que dormissem lá por longo tempo, até que a situação mudasse e outro governante assumisse, com outro tipo de governo.

O resumo da história é apresentado nos dois versículos seguintes: “Narramos-te a sua verdadeira história: Eram jovens que acreditavam em seu Senhor, pelo quê os aumentamos em orientação. E robustecemos os seus corações; e quando se ergueram, disseram: ‘Nosso Senhor é o Senhor dos céus e da terra e nunca invocaremos nenhuma outra divindade em vez d’Ele; porque, com isso, proferiríamos extravagâncias’.” (18:13-14).

A Comparação Entre as Duas Cenas:

1. A primeira cena apresenta um líder correto, crente e profeta, que não ordena ao seu povo a não ser o que Deus lhe ordena. Além disso, ele não lhes deseja a não ser o bem e a reforma. A segunda cena apresenta um governante tirano, que ordena seu povo à idolatria, ao extravio e ao politeísmo.

2. Na primeira cena um grupo de pessoas desobedece à ordem de seu profeta, que é a ordem de Deus, e na segunda cena um grupo de pessoas obedece ao seu governante, apesar de ser uma desobediência crucial a Deus.

3. Na primeira cena as pessoas respondem com o esquartejamento da fêmea de camelo, entre quem preparou o equipamento, quem executou a tarefa, quem viu o mau ato e se calou. Por isso, Deus castigou a todos. Na segunda cena, o clima geral imposto não representou justificativa para um grupo de jovens crentes aceitar o politeísmo. Por isso, Deus os salvou do povo injusto.

4. Deus descreveu o grupo desviado do povo de Samud com as palavras: “E orientamos o povo de Samud; porém, preferiram a cegueira à orientação.” (41:17). E descreveu o grupo crente dos jovens (o Povo da Caverna), dizendo: “Eram jovens que acreditavam em seu Senhor.” (18:13). A diferença é clara: Há lá a preferência da cegueira à visão e há aqui a crença e o aumento da orientação.

5. As pessoas, na segunda cena, obedecem ao governante politeísta e tirano e aceitam os seus atos, calando-se e permitindo a adoração aos ídolos. Porém, os jovens da caverna eram monoteístas e rejeitaram adorar a alguém além d’Ele. Eles não se renderam à corrente, mas nadaram contra ela. As pessoas, na primeira cena, porém, fizeram o contrário, seguiram todos a corrente e mesmo aqueles que não participaram do esquartejamento da fêmea do camelo, aceitaram-no, permitindo que tal ato fosse praticado. A Tradição diz: “A participação coletiva é companheira do ato propriamente dito e sua aceitação. O esquartejamento da fêmea do camelo por um só homem de Samud fez com que Deus incluísse todos no castigo por causa da anuência geral.” Outra Tradição diz: “Quem aceita o ato de um povo é como quem participa dele. Cada um que participa de um mau ato comete dois pecados: O pecado de participar dele e o pecado de aceitá-lo.”

Assim, podemos resumir as diferenças em:

– Na história do povo de Samud, há a participação coletiva no ato ilícito.

– Na história do povo da caverna, os jovens se separam do grupo incrédulo.

– No primeiro caso, há uma mente coletiva que domina as vontades e as paralisa, fazendo-as mover-se sem consciência ou discussão sobre as ordens impostas.

– No segundo caso, uma mente aberta e uma vontade independente rejeitam ser incrédulas, como membros de uma manada.

– No primeiro caso, a incredulidade e o extravio movem-se com base na violência, eliminação das pessoas e auxílio na injustiça.

– No segundo caso, a crença profunda convoca para a conscientização e rejeição da adoração a alguém além do Deus Único.

As Aplicações Práticas:

Entre as aplicações práticas da primeira cena (do povo de Samud), estão os sem caráter ou os que seguem os outros, os envolvidos com a banda, os grasnadores que acompanham todo grasnador, ou a maioria calada que deixa de fazer o que for necessário para evitar a injustiça ou o extravio.

Nós encontramos jovens de ambos os sexos desprovidos totalmente de liberdade e independência. Se nós lhes perguntamos: “Por que estão fazendo isso, perdendo a sua honra e tumultuando sua personalidade?” Respondem: “Fazemos parte da coletividade e não desejamos nos separar dela”, sem levar em consideração se a sua coletividade está agindo corretamente ou não, está certa ou errada, pratica coisas lícitas ou ilícitas. Esse é o fanatismo cego, muito parecido com o do povo de Samud, que se auxilia na prática do ilícito.

A aplicação prática do segundo tipo é o que observamos em termos de crença e conscientização dos jovens de ambos os sexos, que não são levados pela corrente, por mais forte que ela seja. Eles traçaram o seu caminho e discerniram entre o certo e o errado. Mesmo que a sociedade seja débil, injusta e corrupta, isso não justifica a debilitação, o aproveitamento, a injusta e a corrupção. Eles constituem os pilares da luz nos caminhos escuros. Se não fossem eles, seu empenho e paciência, sua conscientização e crença, se não fossem seus protestos em favor da verdade e sua conduta reta, estaríamos tateando nas trevas.

Comete erro quem diz: “Que valor tenho? Que diferença posso fazer? Não passo de um ponto de luz num ambiente de escuridão!”. Ele esquece que um ponto de luz aqui, outro acolá, causa furos na escuridão e que todas as trevas do mundo não conseguem apagar a luz de uma só vela.

Resta dizermos que os jovens da caverna não se isolaram da situação reinante, fugindo da responsabilidade, mas correram à procura de uma solução ou uma saída para combater o politeísmo reinante, que desejava que eles fossem parte dele. Eles quiseram construir o seu próprio edifício, baseado na Unicidade de Deus e na obediência a Ele.

 

 

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