Mulla Sadra Din Shirazi (K.S.)

Mulla Sadra Din Shirazi (K.S.) – O Maior dentre os Sábios do Islam

Shiraz é uma histórica cidade na província de Fars no Irã. As ruínas de Takht-e Jamshid ou Persépolis (um monumental palácio que foi destruído e queimado por Alexandre, o Macedônio) são vizinhas a essa cidade. Na época de Mulla Sadra, a dinastia saváfida governava o Irã. Os reis saváfidas proviam independência à província de Fars que, por sua vez, era governada pelo irmão do rei. Relata-se que o pai de Mulla Sadra foi ministro do governador de Fars.

O pai de Mulla Sadra, Khwajah Ibrahim Qawami, era um político honesto e sábio. Ele era abastado e gozava de alto status, porém não tinha filhos. Entretanto, após muitas súplicas, Deus deu-lhe um filho que chamou de Muhammad e apelidado de Sadra. Nos anos subseqüentes o título ‘Mulla (sábio) Sadra’ tornou-se mais famoso que seu próprio nome.

Sadr al-Din ou Sadra foi o único filho do ministro do governador da vasta região do Fars e gozou do mais alto padrão da vida aristocrática. Era comum, na época, que as crianças da aristocracia fossem educadas por professores particulares em suas próprias casas. Sadra era um garoto extremamente inteligente, vivaz, curioso e estudioso e adquiriu domínio da gramática, literatura, assim como da arte da caligrafia, em um curto espaço de tempo. Seguindo as antigas tradições, ele teve de aprender, também, a montar, caçar e lutar. Matemática, astronomia, medicina (rudimentos), ciências jurídicas, jurisprudência islâmica, lógica e filosofia estavam, também, entre os cursos que os jovens, supostamente, freqüentavam na época. O jovem Sadra, que não tinha, ainda, atingido a puberdade, conquistou alguns destes campos de conhecimento; entretanto, ele estava, particularmente, interessado em filosofia e, mais precisamente, em irfan (disciplina islâmica que busca a realização, a visão de verdades metafísicas).

As anotações encontradas de sua juventude revelam claramente seu interesse pelo misticismo em geral e pela poesia de Farid al-Din Attar (1119-1193 A.D.), Jalal al-Din Rumi, conhecido como Maulana (1207-1273 A.D.), Iraqi (d.c. 1288 A.D.) e Ibn Arabi (1165-1240 A.D.), em particular.

Ele foi educado em Shiraz por algum tempo, porém a maior parte de sua educação foi, provavelmente, completada na capital daquele tempo, Qazwin. Devemos esta suposição à ascensão ao trono do irmão do rei, ex-governador de Fars e empregador do pai de Sadra, parecendo bastante improvável que este não o acompanhasse com sua família.

Nesta época, Mulla Sadra travou conhecimento de dois eminentes sábios e cientistas : Shaykh Baha al-Din Ameli e Mir Damad, ambos únicos em sua época, assim como nos 4 séculos subseqüentes. Mulla Sadra começou a estudar com eles e, em razão de seu precoce talento, tornou-se o melhor de seus alunos em um curto período de tempo.

Shaykh Baha não era, apenas, um expert em ciências islâmicas (particularmente jurisprudência, hadith, exegese, teologia e irfan), mas, também, mestre em astronomia, matemática, engenharia, arquitetura, medicina e certos campos de conhecimentos místicos e paranormais; entretanto, parece que devido a suas idéias sufis, ele não lecionava filosofia e teologia.

Mir Damad dominava todas as ciências de seu tempo, porém seu ensino se limitava à jurisprudência, hadith e, principalmente, filosofia. Era mestre nos ramos aristotélico e iluminacionista da filosofia islâmica. Mulla Sadra obteve a maior parte de seu conhecimento de filosofia e irfan de Mir Damad e sempre reportou-se a ele como seu mestre e guia espiritual.

Quando a capital Saváfida foi transferida para Isfahan (1006 A.H./1598 A.D.), Shaykh Bah al-Din e Mir Damad, acompanhados por seus alunos, mudaram-se para lá e iniciaram uma campanha de divulgação de conhecimento. Mulla Sadra, que tinha cerca de 26 ou 27 anos nessa época, tornou-se mestre e pensava em estabelecer novos princípios filosóficos e uma nova escola de pensamento. A biografia de Mulla Sadra é um tanto ambígua. Não é claro quanto tempo ele esteve em Isfahan e para onde foi em seguida. Aparentemente, ele mudou-se de Isfahan antes de 1010 A.H. e retornou para sua cidade, Shiraz. As propriedades e bens de seu pai estavam em Shiraz, e embora tenha doado muito aos pobres, parte deles ainda existem em Shiraz e Fars em forma de propriedades consagradas para usos religiosos.

Em Shiraz, portanto, Mulla Sadra começou a ensinar e muitos estudantes, de várias partes do país, começaram a assistir suas aulas. Seus rivais, entretanto, que, como muitos teólogos e filósofos, seguiam cegamente os pensadores antigos e tradicionais, sentiram seus status ameaçados e começaram a mal dizê-lo e ridicularizar suas idéis, insultando-o, inclusive, movidos, quiçá, por inveja.

Tal pressão e comportamento não eram compatíveis com a sensibilidade de Mulla Sadra. Por outro lado, sua fé, crença e piedade, não o permitiram reagir e tratá-los com a mesma rudeza. Em face disto, ele deixou Shiraz e foi para Qum, que na época não era ainda o centro científico e filosófico.

Mulla Sadra não ficou em Qum, propriamente, por causa de seu clima hostil ou por causa das condições sociais similares as de Shiraz, ele ficou em uma vila chamada Kahak nos subúrbios.

Depressão e esgotamento nervoso fizeram com que Mulla Sadra deixasse o ensino e o debate por um certo período e, como escreveu na introdução de sua grande obra, al-Asfar, ele se dedicou à devoção, jejum e práticas ascéticas. Esta oportunidade, que de certa forma se deveu as circunstâncias, ajudou-o a ascender espiritualmente.

Esse período é conhecido como o período de ‘ouro’ de sua vida, do ponto de vista espiritual. Ao invés de deixar-se abater pelas adversidades, ele buscou alcançar o estágio de desvelamento e intuição do oculto e perceber as verdades filosóficas com o “olho do coração”. Justamente esta proeza contribui para a perfeição de sua escola de pensamento.

Se considerarmos a extensão do período em que esteve recluso como 5 anos, ele saiu dela cerca de 1015 A.H. (1607 A.D.). Ele, então, voltou a escrever, começando seu monumental, al-Asfar, considerado uma enciclopédia filosófica.

Ele não retornou a Shiraz até 1040 A.H. (1632 A.D.). Equanto esteve em Qum, fundou um centro filosófico, treinou diversos alunos, e, durante este tempo esteve ocupado escrevendo seus livros e tratados em resposta aos filósofos contemporâneos a ele.

Mulla Sadra retornou a Shiraz entre 1039 e 1040 A. H. (1632 A.D.). Alguns crêem que o motivo de seu retorno tenha sido um convite recebido pelo governador da província de Fars, Allah Werdi Khan. O motivo teria sido o fim da construção de uma escola que seu pai, Imam Quli Khan, tinha começado, e preparou-a para o ensino de filosofia, e devido a sua prévia admiração a Mulla Sadra, ele convidou-o a Shiraz para ser seu supervisor.

Mulla Sadra envolveu-se no ensino de filosofia, assim como no de interpretação do Alcorão e hadith nesta nova escola e treinou muitos estudantes nela. Entendemos de seu livro Si Asl (três princípios), que foi escrito neste período e em persa e que ataca veementemente os letrados de seu tempo, incluindo teólogos, filósofos, juristas e físicos. Novamente, Mulla Sadra, esteve sob a pressão da conduta viciosa e difamadora dos sábios de Shiraz, dessa vez, porém, ele estava fortalecido e decidiu enfrentá-los e introduzir e estabelecer sua própria linha filosófica.

Um dos aspectos marcantes da vida de Mulla Sadra foram suas freqüentes visitas à Ka’ba. Narra-se que Mulla Sadra fez 7 peregrinações (aparentemente a pé). Quatro séculos atrás, ao contrário dos dias de hoje, a peregrinação era considerada uma prática ascética devido às dificuldades inerentes na viajem – distância, calor, sede sofrida no deserto, etc. – inclusive muitas pessoas morriam durante ela.

Redimensionando suas práticas ascéticas, Mulla Sadra trilhou esta jornada sete vezes e, eventualmente, na sua sétima e última adoeceu em Basra, Iraque, e faleceu, deixando esse mundo para aqueles que estão obcecados por ele.

Narra-se que Mulla Sadra faleceu em 1050 A.H./ 1640 A.D.; entretanto, cremos que uma data mais exata seria 1045 A.H./1635 A.D., que seu neto, Ilma al-Huda registrou em seus escritos. A súbita interrupção de sua interpretação do Alcorão e de sua explanação dos ahadith compilados por Kulayni, em 1044 A.H./1634 A.D. são boas indicações que suportam essa hipótese.

De acordo com a tradição xiita, Mulla Sadra morreu em Basra, porém foi levado à Najaf (no Iraque) e segundo seu neto, Ilma al-Huda, foi sepultado no lado esquerdo do santuário do Imam Ali (a.s.).

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